sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

O PACTO DAVÍDICO


O “pacto davídico” é um momento dos mais importante do plano de Deus para a salvação da humanidade, pois é o instante em que se revela a dignidade real do Messias e sua condição de “Filho de Davi”.

I – OS PACTOS DIVINOS DO ANTIUGO TESTAMENTO

- Neste último estudo complementar do trimestre letivo a respeito da vida de Davi, analisaremos o chamado “pacto davídico”, o último pacto divino do Antigo Testamento, quando o Senhor revela ao mundo que o Messias, o Salvador seria da casa de Davi, dinastia que se iniciava em Israel.

- O instante em que Deus revela a Davi, por meio do profeta Natã, que o Senhor é quem edificaria casa eterna para Davi e não Davi uma casa para o Senhor, como era o desejo do rei, é o ápice da vida espiritual do “homem segundo o coração de Deus”, em que o rei se vê como um elemento-chave de um plano que nem sequer tinha como imaginar.

- Deus, no Seu desejo de Se relacionar com o homem, tendo-o dotado tanto de razão quanto de espiritualidade, por Seu profundo amor, sempre tomou a iniciativa de firmar com o ser humano “pactos”, ou seja, compromissos a fim de abençoar o homem.
OBS: “…O conceito de pacto permeia a compreensão hebraica de sua relação com Deus. Yahweh, o auto-existente Deus, inicia e mantém aliança com o homem. Ele é motivado por um amor inabalável chamado hesed, que é traduzido ‘bondade amorosa’ ou ‘misericórdia.’ Que o Deus transcendente condescende para entrar em parceria com a sua própria criação é realmente motivo de culto. Ele não é dependente de nada, nós não temos nada para oferecer-lhe que ele primeiro não nos tenha dado. No entanto, ele deseja fazer um pacto com os homens, e entrar em um relacionamento pessoal com sua criação. Porque a natureza de Deus é pactual, nós que somos criados à sua imagem também fazemos pactos. O termo hebraico berith é utilizado mais de 280 vezes no Antigo Testamento para descrever tratados, alianças, ou ligas entre os homens. Ele é usado para descrever uma constituição entre um governante e os seus subordinados. E é utilizado com referência a uma relação entre Deus e seu povo.…” (REASONER, Vic. Uma teologia arminiana do pacto. Trad. de Lailson Castanha. Revista Arminiana - Vol 18 Edição 2 - outono 2000. Disponível em: http://www.arminianismo.com/index.php?option=com_content&view=article&id=790:uma-teologia-arminiana-do-pacto&catid=175&Itemid=29 Acesso em 29 out. 2009)


- Num pacto, como diz Vic Reasoner, o padrão básico continha “…um preâmbulo, em que o iniciador é identificado; uma introdução histórica anterior descrevendo as relações entre as partes; estipulações e demandas que deveriam ser lidas publicamente em intervalos regulares; juras de um juramento com bênçãos e maldições; e a designação de testemunhas e sucessores.…” (end. cit.).

- Os estudiosos da Bíblia costumam considerar os seguintes pactos firmados entre Deus e o homem, todos visando a salvação do homem:
a) o pacto edênico ou pacto da criação — Este pacto encontra-se em Gn.2:16,17, quando o Senhor condicionou a vida eterna à obediência do homem em não comer da árvore da ciência do bem e do mal no Jardim do Éden, sob pena de morte. O primeiro casal não obedeceu à condição pré-estabelecida e, por isso, foram separados de Deus, cumprindo-se, assim, a cláusula referente à morte, seguida, ainda, de outras maldições, que se encontram em Gn.3:14-19. Entre elas, Deus fez a promessa de que salvaria o homem das garras do pecado por meio da “semente da mulher que esmagaria a semente da serpente”, uma maldição sobre a serpente, mas, simultaneamente, uma bênção para a humanidade.

b) o pacto noaico – Este pacto encontra-se em Gn.9:1-16, que os judeus chamam de “Shéva Mistvót Benê Nôach” (os Sete Preceitos dos Descendentes de Noé), quando o Senhor abençoou Noé e seus filhos depois do dilúvio, retomando as ordens de frutificação e multiplicação dada aos primeiros pais, como também o domínio do homem sobre a criação terrena, estabelecendo, porém, preceitos morais de defesa da vida e proibição de consumo de sangue, prometendo também nunca mais destruir a criação terrena com um dilúvio, pondo o arco-íris no firmamento como prova e lembrança da Sua promessa.

c) o pacto abraâmico – Este pacto encontra-se em Gn.12:1-3 e 17:1-14, quando o Senhor chamou Abraão para dele formar uma grande nação em que seriam benditas todas as famílias da Terra. Neste momento, Deus começa a formar a nação de onde viria o Salvador do mundo. Neste pacto, Deus promete ter um concerto perpétuo com a nação que surgiria de Abraão, por intermédio de Isaque, estabelecendo a circuncisão como símbolo deste pacto, desde que houvesse, por parte do homem, a fé no Senhor (“andar na presença do Senhor, o Todo-Poderoso, e ser perfeito”).

d) o pacto sinaítico – Este pacto encontra-se em Ex.19:5-9, quando o Senhor propôs a lei ao povo de Israel no monte Sinai e os israelitas se comprometeram em cumprir os mandamentos que receberiam da parte do Senhor, por intermédio de Moisés. Neste momento, já formada a nação de Israel, Deus lhe traz regras e mandamentos, sob os quais haveria de nascer o Messias, que era a personagem apontada por todos os ritos, cerimônias e regras deste pacto (Gl.3:23,24; Hb.10:1).

e) o pacto palestiniano – Este pacto encontra-se em Js.8:30-35, onde se cumpriu o determinado em Dt.27 e 28. Nesta ocasião, cumprindo a ordem do Senhor, os israelitas, já instalados em Canaã, mesmo em meio à conquista ainda, comprometem-se a observar a lei de Moisés como condição para que permanecessem na “terra que mana leite e mel”. O cativeiro da Babilônia e a diáspora vivida a partir de 70 d.C. são consequências diretas do descumprimento deste pacto.

f) o pacto davídico – Este é o pacto que estudaremos neste breve apêndice, encontrado em II Sm.7:5-17, repetido em I Cr.17:7-15, quando o Senhor, em resposta ao desejo de Davi de edificar-Lhe um templo, diz que o templo só seria edificado pelo sucessor de Davi, mas que quem haveria de edificar casa para Davi era o próprio Senhor, pois a casa de Davi reinaria para sempre. Com isto, dando mais um passo no cumprimento de Seu plano para salvar o homem, Deus revela qual seria a estirpe, a família de onde surgiria o Messias.

II – O PACTO DAVÍDICO

- Davi tinha a visão da arca do Senhor em uma tenda que havia preparado para ela em Jerusalém, ao mesmo tempo em que habitava num palácio, cuja construção havia sido possível mediante uma aliança que firmara com Hirão, rei de Tiro, aliança esta, aliás, que o havia feito entender que seu reino havia sido confirmado pelo Senhor (II Sm.5:11,12).

- Davi não suportou a circunstância de morar num palácio, enquanto a arca do Senhor se encontrava numa tenda e decidiu que iria construir uma casa para o Senhor. Neste seu desejo, Davi mostra que dava prioridade, em seu governo, ao culto a Deus, que compreendia, como homem espiritual que era, que seu papel como rei de Israel era o de fazer com que sua nação cumprisse o propósito assumido no monte Sinai de ser “um reino sacerdotal e um povo santo” (II Sm.7:1-3; I Cr.17:1,2).

- Este desejo de Davi não era, nem poderia ser, desagradável a Deus. Seus intentos e sua motivação eram da mais perfeita razoabilidade e demonstravam uma espiritualidade elevada. Por isso, ao confidenciar este seu plano ao profeta Natã, o homem de Deus não titubeou em confirmar as intenções de Davi, estimulando-o a fazê-lo, sem que, no entanto, tivesse consultado a Deus ou tivesse falado em nome do Senhor. Deixou-se levar pelas evidências lógico-humanas, o que, entretanto, nunca deve ser feito por quem é escolhido pelo Senhor para trazer mensagens para o povo.

- Deus não pensa como o homem, pois senão não haveria de ser Deus (Is.55:8,9). Deus, por definição, é superior ao homem e, por isso, jamais poderemos entendê-lO (Pv.20:24). Não se pode, pois, admitir qualquer doutrina ou filosofia que esquadrinhe Deus em princípios e regras previamente estabelecidos pelo ser humano e que tudo expliquem. O que sabemos a respeito de Deus é tão somente aquilo que nos foi revelado pela Bíblia Sagrada (Dt.29:29), que é a verdade (Jo.17:17). Tudo o mais não passará de especulação e de vaidade humana. Cuidado com os “especialistas em Deus”, com os “doutores em divindade”, com aqueles que tudo sabem e tudo explicam à revelia das Escrituras…

- Naquela mesma noite, como Deus não é Deus de confusão (I Co.14:33), o Senhor se apresentou ao profeta Natã e o mandou desfazer a “profetada”, dizendo a Davi que ele não iria edificar o templo em Jerusalém, mas que tal tarefa ficaria a cargo de seu sucessor. O Senhor, como se vê, não recriminou o genuíno propósito de Davi, tanto que o confirmou (I Rs.8:18), mas queria mostrar ao Seu ungido que havia reservado para ele algo mais excelente do que ser o construtor e inaugurador do templo, onde se unificaria e de estabilizaria o culto a Deus em Israel, como um importante fator de estímulo ao cumprimento do propósito divino para Israel, mas que seria ele o construtor e o inaugurador da dinastia real de onde viria o Messias, cujo templo era muito mais importante que o que fosse construído com pedras (Jo.2:19,20).

- Muitos líderes, na atualidade, precisam ter este mesmo despertamento que Deus deu a Davi. Estão muito preocupados na construção de templos de pedras, esquecendo-se de que sua mais importante tarefa é ser “pescador de homens”, é construir o corpo de Cristo, este templo que não poderá ser derribado pelas portas do inferno, contra o qual não podem se levantar as hostes espirituais da maldade. Não podemos ter a mentalidade dos judeus que viam (e ainda veem) no templo material o suprassumo de seu culto a Deus, mas entender que os verdadeiros adoradores adoram o Pai em espírito e em verdade (Jo.4:20-24).

- É evidente que não somos contrários à criação de templos, visto que são eles necessários para que se tenha o devido culto a Deus, além do que servem eles de referência indispensável para que se cumpram as funções determinadas à Igreja na sua tarefa de evangelização dos perdidos e edificação dos salvos, mas não podemos, de forma alguma, tornar prioritário na administração das igrejas locais a construção civil. Muitos ministros do Evangelho reduziram-se a mestres de obras, o que não se pode admitir. O Senhor quis mostrar a Davi que ao homem segundo o coração de Deus está reservada uma tarefa mais importante que a da construção civil, embora não tenha, em momento algum, recriminado esta iniciativa, como já dissemos.

- Na Sua mensagem a Davi, o Senhor, em primeiro lugar, disse que nunca havia pedido que se Lhe construísse uma casa de cedros. Havia, pelo contrário, determinado que se construísse o tabernáculo para que ali fizesse sentir Sua presença no meio do povo. O que exigia de Davi é que apascentasse o Seu povo e que o objetivo de Deus era a preparação deste povo para que fosse ele plantado no lugar em que habitasse e dali nunca mais fosse removido nem afligido pelos filhos da perversidade. Por isso, aliás, havia dado descanso a Davi de todos os seus inimigos em redor (II Sm.7:8-11; I Cr.17:7-10).

- O Senhor mostra a Davi que mais importante do que edificar-Lhe casa de cedros era apascentar o povo de Israel. A pessoa humana tem prioridade para o Senhor. O homem foi feito a coroa da criação e é ele o bem mais precioso que existe no povo de Deus. Os pastores devem ter isto sempre em mente, pois, se jamais se esquecerem desta realidade, terão um comportamento totalmente diverso em relação a cada crente, cuja alma vale mais do que o mundo inteiro (Sl.49:7,8). Quantos, na atualidade, estão a sacrificar centenas, quiçá milhares de crentes, decepcionando-os, escandalizando-os em troca de alguns milhares e até milhões de reais ou de dólares norte-americanos? Ah, se soubessem quanto vale uma alma e o que é prioritário aos olhos do Senhor…

- O Senhor esperava de Davi que contribuísse, no seu governo, para o plano divino de fixação de Israel em um lugar de forma definitiva, para que de lá nunca fosse removido, o que, em outras palavras, nada mais era que um esforço do rei para que o povo servisse a Deus, pois somente na obediência ao Senhor, conforme os pactos sinaítico e palestiniano, pudessem permanecer na Terra Prometida (II Sm.7:10; I Cr.17:9).

- Deus havia abençoado Davi para que vencesse todos os inimigos ao redor de Israel para que eles tivessem descanso. Isto só pôde ser feito por Davi porque Deus o ajudou neste sentido, porque Deus o abençoou para que isto se concretizasse, tanto que, com Davi, Israel, pela vez primeira, chegou aos limites prometidos por Deus a Abraão. Mas não seria com Davi que isto se daria de modo definitivo. Na profecia, vemos claramente que Deus haveria, ainda, de fazer isto e, como sabemos, tal promessa somente se realizará com o próprio Jesus, em Seu reino milenial.

- Esta palavra, ademais, pode, sim, legitimamente, ser aplicada aos ministros do Evangelho em nossa atual dispensação. O “Israel de Deus” (Gl.6:16) também tem sido afligido pelos filhos da perversidade (Jo.16:33). Caminhamos neste mundo de aflições com bom ânimo, sabendo que Jesus já venceu o mundo e brevemente nos tirará daqui para que estejamos com ele para sempre, onde jamais poderemos ser afligidos novamente. Enquanto isto não acontece, os pastores, a quem incumbe apascentar o rebanho de Deus (I Pe.5:1-3), têm a responsabilidade de contribuir para que os crentes em Cristo se mantenham no lugar da bênção (os “lugares celestiais em Cristo” – Ef.1:3), a fim de que sejam devidamente plantados para que não sejam debilitados nem removidos de onde estão (“na rocha”, ou seja, em Cristo – Sl.40:2; I Co.10:4).

- Revela, então, o Senhor a Davi que edificaria casa ao rei. Em vez de Davi edificar uma casa ao Senhor, seria o Senhor quem construiria uma descendência, uma dinastia, uma casa real a Davi. Por isso, um dos filhos de Davi se assentaria no trono de Israel e teria o seu reino confirmado. Este sucessor é quem edificaria casa ao Senhor e o seu trono seria confirmado para sempre. Ao contrário do que havia ocorrido com Saul, o antecessor de Davi, Deus Se faria pai deste sucessor e ele seria Seu filho, a benignidade divina não se desviaria deste sucessor e ele seria confirmado na casa do Senhor e no Seu reino para sempre e o seu trono seria firme para sempre (II Sm.7:10-17; I Cr.17:10-15).
OBS: “…A promessa que ‘a casa’, ‘o reino’ e ‘o trono’ de Davi seriam estabelecidos para sempre é significativa porque mostra que o Messias viria da linhagem de Davi e que Ele estabeleceria um reino sobre o qual Ele reinaria. O pacto é sintetizado pelas palavras ‘casa’, prometendo uma dinastia na linhagem de Davi; ‘reino’, referindo-se a um povo que seria governado por um rei; ‘trono’, enfatizando a autoridade do mandamento do rei; e ‘para sempre’, enfatizando a natureza eterna e incondicional desta promessa para Davi e Israel…” (O que é o pacto davídico? Disponível em: http://www.gotquestions.org/Davidic-covenant.html Acesso em 31 out. 2009) (tradução nossa de texto em inglês).

- O fato de Davi não edificar o templo servia, assim, como uma comprovação de que Deus havia suscitado uma casa real para o Seu ungido. Seria o seu sucessor, um de seus filhos, que haveria de edificar casa para o Senhor. Este sucessor deve ser entendido em uma dupla aplicação do texto, a saber: uma aplicação imediata e uma aplicação futura.

- A aplicação imediata foi a prova de que Deus estava constituindo uma dinastia real. O sucessor de Davi construiu a casa que Davi havia desejado mas não iria fazê-lo. Com efeito, Salomão construiu o templo em Jerusalém, tendo, no ato da inauguração, relembrado, diante de todo o povo, a promessa que havia sido feita pelo Senhor (I Rs.8:12-21; II Cr.6:14-19).

- Após a construção e inauguração do templo, Deus apareceu a Salomão e mostrou ao rei que o pacto estabelecido com Davi dependia de uma condição para que fosse mantido, qual seja: a fidelidade de cada ocupante do trono de Davi. Cada rei que assumisse o trono, para ter seu reino confirmado, deveria andar como Davi andou e fazer tudo o que o Senhor ordenara na lei de Moisés, sob pena de o Senhor não só fazer valer o pacto palestiniano, retirando o povo da Terra, como também destruiria não só o templo de Jerusalém como também apearia do poder real a casa de Davi (I Rs. 9:1-9; II Cr.7:17-22). Vemos, pois, que o pacto davídico não era um pacto incondicional, mas que dependia do cumprimento, por parte dos descendentes de Davi, da observância da lei, como também a promessa não se esgotava em Salomão, mas tinha uma aplicação futura.
OBS: “…Neste pacto com Davi, Yahweh apresenta a Davi duas categorias de promessas: aquelas que se realizariam durante o tempo de vida de Davi (II Sm. 7:8-11a) e aquelas que encontrariam cumprimento depois de sua morte (II Sm. 7:11b-16). …” (GRISANTI, Michael A. O pacto davídico. Disponível em: http://www.tms.edu/tmsj/tmsj10p.pdf Acesso em 31 out. 2009) (tradução nossa de texto em inglês).

III – O CUMPRIMENTO DO PACTO DAVÍDICO AO LONGO DA HISTÓRIA DE ISRAEL

- A aplicação futura do pacto davídico diz respeito ao fato de que surgiria das entranhas de Davi, de sua semente, alguém que edificaria casa ao Senhor e que reinaria para todo o sempre sobre Israel. Este não era Salomão, pois, além de o próprio Salomão, na dedicação do templo, ter relembrado a promessa divina de perpetuidade da casa de Davi como algo futuro e ainda não acontecido (I Rs.8:25,26; II Cr.6:16), o Senhor, como já vimos, apareceu a ele, depois da dedicação do templo, para mostrar-lhe a condicionalidade do pacto inclusive para ele, que havia construído o templo.

- O fato é que os descendentes de Davi, a começar do próprio Salomão, não cumpriram com a condição de se manter fiel aos mandamentos do Senhor. Salomão, por causa da multiplicação de mulheres, caiu na idolatria e, por isso, o Senhor lhe tomou dez das tribos de Israel (I Rs.11:1-13; II Cr.10:15,19).

- Como se isto ainda fosse pouco, Manassés, o 14º rei de Judá (portanto, o 16º da linhagem da casa de Davi), aquele que mais tempo reinou sobre o povo de Deus (cinquenta e cinco anos — II Rs.21:1; II Cr.33:1), extrapolou todos os limites de desobediência aos mandamentos do Senhor, numa impiedade nunca antes vista sobre o povo, de tal maneira que, por causa de seus muitos pecados, determinou o Senhor que a casa real de Judá seria retirada do trono, por força mesmo do pacto davídico (II Rs.21:1-16; II Cr.33:1-10).
OBS: Alguém pode, corretamente, observar que Uzias também reinou 55 anos sobre Judá (II Cr.26:3), mas não podemos nos esquecer que não governou todo este tempo, visto que, por ter ficado leproso, foi declarado imundo e, num período não explicitamente determinado nas Escrituras (Flávio Josefo afirma que isto aconteceu no 52º de seu reinado, portanto, teria “reinado” leproso por três anos), reinava mas não governava, pois foi substituído pelo seu filho Jotão, que era quem efetivamente administrava Judá a partir deste instante – II Cr.26:20,21.

- Apesar do avivamento proporcionado por Josias, neto de Manassés, o Senhor manteve a Sua sentença contra Judá e a casa de Davi, como deixou claro na palavra que trouxe por intermédio da profetisa Hulda, quando se descobriu o livro da lei no templo de Jerusalém (II Rs.22:14-20; II Cr.34:22-28).

- Deus não foi insensível aos clamores de Josias e do povo. Na verdade, vemos que, morto Josias, a geração que se lhe seguiu não cessou de desobedecer ao Senhor. Os sucessores de Josias, três de seus filhos e um neto (Joacaz, Joaquim, Jeconias ou Jeioaquim – este, neto de Josias — e Zedequias) não serviram a Deus e fizeram o que era mal aos olhos do Senhor. Como consequência disto, o profeta Jeremias foi usado por Deus para relembrar a sentença de perda da dignidade real da casa de Judá (Jr.22), em especial a Jeconias, que, por ser o neto de Josias, era o “natural” suscitador de semente à casa real de Judá.

- Em palavra a Jeconias (ou Joaquim, na ARC), o profeta Jeremias afirmou que estaria “privado de seus filhos, homem que não prosperará nos seus dias nem prosperará algum de sua geração para se assentar no trono de Davi e reinar mais em Judá” (Jr.22:30).
- Teria, então, o Senhor quebrado o pacto davídico? De forma alguma! O pacto davídico era condicional, no que respeita à manutenção no trono de um descendente de Davi, à observância deste descendente dos mandamentos, estatutos e juízos do Senhor. Entretanto, os descendentes de Davi não se mantiveram fiéis ao Senhor e, por isso, o Senhor fez o que havia dito a Salomão. Destruiu o templo e não permitiu mais que alguém da casa de Davi reinasse sobre Judá.

- Mas, se o Senhor ratificou que não haveria mais quem reinasse sobre Judá da casa de Davi, não permitiu, porém, que a semente de Davi fosse destruída, o que era o que de mais natural ocorria quando da conquista de um povo por outro, em especial quando este povo era o da Babilônia, cuja política era a da mistura dos povos conquistados para que perdessem a sua identidade.

- Como prova de que Deus não havia se esquecido de seu compromisso com Davi, fez com que o rei de Babilônia, Evil-Merodaque, no 37º ano do cativeiro, levantasse ao mesmo Joaquim (ou Jeconias) da profecia de Jeremias da cabeça da prisão e lhe desse um lugar de destaque na sua corte, lugar que reteve até a sua morte. Com esta elevação, Deus impediu que a dinastia de Davi se extinguisse e, assim, o plano da redenção da humanidade prosseguisse (II Rs.25:27-30; Jr.52:31-34).

- Quando o povo retornou a Jerusalém, o próprio Senhor determinou que fosse reconstruído o templo, apesar de toda a oposição dos gentios. Esta reconstrução foi dirigida por ninguém mais, ninguém menos que Zorobabel, bisneto de Jeconias, neto de Pedaías e filho de Sealtiel (I Cr.3:15-19).

- Muitos discutem como que Jeremias disse que Jeconias seria “privado de filhos” e, em I Crônicas, é dito que teve dois filhos (Assir e Sealtiel). Há alguns que dizem que Sealtiel não seria filho biológico de Jeconias, mas, sim, um sobrinho que teria sido adotado como filho na corte de Babilônia, buscando, inclusive fundamento para tal pensamento na genealogia de Jesus, vez que Sealtiel é ali apontado como filho de Neri, que seria descendente de Natã (outro filho de Davi com Bate-Seba – I Cr.3:5) e não de Salomão (Lc.3:27-31). Como não é dada qualquer descendência de Assir, ter-se-ia cumprido a profecia de Jeremias sem que se tivesse quebrado o pacto davídico, visto que se tem a manutenção não só da linhagem legal como também biológica da linhagem de Davi e Bate-Seba.

- Zorobabel dirigiu a reconstrução do templo em Jerusalém, atendendo às determinações do Senhor feitas pelos profetas Ageu e Zacarias (Ed.5:1,2; 6:14). O templo foi, então, reconstruído por um descendente de Davi, que, mais uma vez, edificava-Lhe casa. Zorobabel, porém, não mais ostentava a dignidade real e, por isso, não era a personagem mencionada na aplicação futura do pacto davídico.

- Tanto assim é que, em meio à reconstrução do templo, vieram a Zorobabel duas mensagens da parte do profeta Ageu.

- Na primeira delas (Ag.2:1-9), o Senhor, além de confirmar a necessidade da reconstrução do templo, prometeu que, “daqui a pouco”, faria tremer os céus, a terra, o mar, a terra seca, todas as nações e trariam os tesouros de todas as nações e a casa se encheria de glória, pois a glória daquela casa seria maior que a da primeira e naquele lugar daria o Senhor a paz.

- Em Ag.2:7, há muita discussão sobre a tradução, pois algumas versões traduzem “tesouros de todas as nações” como o “Desejado de todas as nações”, fazendo, pois, alusão, nesta profecia, ao Messias, que seria apontado nesta profecia, em uma demonstração de que o pacto davídico ainda estava de pé, embora não fosse se cumprir em Zorobabel.

- Sem adentrarmos nesta discussão, o certo é que, nesta profecia de Ageu, mostra-se que a reconstrução do templo era necessária mas não se daria ali o cumprimento do pacto davídico, pois aquela casa testemunharia uma glória maior que a da primeira, que fora construída por Salomão. Ora, tal não se deu na construção do Segundo Templo, pois, ao contrário do que ocorrera com Salomão (e mesmo no tabernáculo com Moisés), quando o Segundo Templo foi dedicado, a glória do Senhor não apareceu e não encheu aquela casa (Ed.6:15-22). Esta glória viria “daqui a pouco”, como afirmou o Senhor.

- Na segunda profecia de Ageu, o Senhor prometia fazer tremer os céus e a terra, derrubar o trono dos reinos e destruir a força dos reinos das nações, quando então seria tomado Zorobabel e feito “anel de selar”, porque havia Zorobabel sido escolhido pelo Senhor (Ag.2:20-23).

- Ora, quando o profeta Ageu se dirige a Zorobabel, chama-o de “príncipe de Judá”. Zorobabel nada mais era que um simples “príncipe”, pois, embora fosse o herdeiro da coroa real de Judá e estivesse, por milagre, à frente do povo apesar desta condição, não podia, de forma alguma, governar sobre os judeus, que eram servos dos reis da Pérsia, tanto que edificavam o templo “conforme o mandado de Ciro e de Dario, e de Artaxerxes, rei da Pérsia” (Ed.6:14 “in fine”). Como, então, haveria o Senhor de “derrubar o trono dos reinos e destruir a força dos reinos das nações” nos dias de Zorobabel, que nem sequer se tornou rei?

- Deus confirmava a Zorobabel que o havia escolhido para dar a continuidade à semente de Davi. O templo estava sendo reconstruído, mas não seria ainda Zorobabel quem haveria de ser o descendente que firmaria o seu trono para sempre em Israel. Deus queria a reconstrução do templo, mas não seria nesta reconstrução que se cumpriria a promessa dada à casa de Davi. O cumprimento ainda seria no futuro, quando, inclusive, os poderes gentílicos, que hoje dominavam sobre os judeus, seriam extirpados.

- Tal circunstância foi bem compreendida pelo povo judeu no cativeiro, como vemos, por exemplo, na oração feita pelos maiorais dos levitas nos dias de Neemias (Jesua, Cadmiel, Bani, Hasabneias, Serebias, Hodias, Sebanias e Petaías) (Ne.9:34-38).

- Este descendente de Davi, que teria seu trono confirmado para sempre e que traria a glória do Senhor para o Segundo Templo, é Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Desde o instante em que entrou, pela vez primeira, no templo em Jerusalém, foi apresentado como a salvação do Senhor, a luz para alumiar as nações e a glória de Israel (Lc.2:29-32). Quando retornou a este mesmo templo, doze anos depois, apresentou-Se como a sabedoria de Deus, causando admiração por Sua inteligência e respostas, mostrando-Se como o Filho (Lc.2:46-49), como anunciado no pacto davídico (II Sm.7:14a; I Cr.17:13a).

- O Segundo Templo teve, assim, maior glória que o primeiro, pois, se no Primeiro Templo, a glória de Deus se apresentou e encheu a casa por ocasião da inauguração, no Segundo, o próprio Deus compareceu, através da pessoa do Filho, trazendo, neste mesmo templo, o Seu poder, o Seu amor e os Seus ensinos.

- Mas o verdadeiro templo não era aquele construído por Zorobabel e reformado por Herodes, cuja beleza causava admiração a todos os judeus (Mt.24:1,2; Lc.21:5,6). Logo no início de Seu ministério terreno, Jesus foi ao templo e, conforme a narrativa de João, ali revelou qual era o verdadeiro templo: aquele que seria derribado, mas que, em três dias, tornaria a se levantar: o Seu corpo (Jo.2:19-21). Esta afirmação de Jesus calou profundamente na mente dos judeus, tanto que foi a principal acusação que lhe fizeram no Sinédrio, quando de Seu julgamento perante os judeus (Mt.26:59-61; Mc.14:57-59).

- Jesus edificou uma casa que não seria jamais derribada: a Sua Igreja (Mt.16:18), que é o Seu corpo (I Co.12:27). Esta casa somos nós (Hb.3:3-6) que, enquanto aqui estamos, devemos nos portar como templo do Espírito Santo (I Co.6:19).

- Mas, além de ser o edificador da casa que jamais seria derribada, Jesus, também, é Aquele que terá confirmado o Seu reino e o Seu trono para sempre. A outra acusação que se fez contra o Senhor Jesus, desta feita, perante os romanos, foi precisamente o de Se declarar rei dos judeus (Lc.23:1-3; Jo.18:33-37).

- A Pilatos, Jesus mostrou que Seu reino não era deste mundo, indicando, assim, que não haveria de ser nesta ocasião em que seria confirmado n’Ele o reino e o trono de Davi. Isto se dará no futuro, quando o Senhor retornará glorioso com a Sua Igreja, a casa que tiver edificado, derrotando o Anticristo e se estabelecendo em Israel, não só como rei dos judeus, mas como rei de todas as nações, Rei dos reis e Senhor dos senhores, derrubando os tronos de todas as nações, como profetizado por Ageu (Is.11; Dn.2:44,45; Ap.19:11-21; 20:4).

- Conforme podemos ver, o pacto davídico está em pleno vigor ainda, não tendo sido definitivamente cumprido, já que Jesus ainda não ocupou o trono de Israel, como prometido por Deus a Davi. Nem se diga que Jesus disse que Seu reino não era deste mundo, pois, efetivamente, não no é, mas o pacto firmado com Davi fala do “trono de Davi”, do “reino de Davi” e sabemos bem que o trono de Davi e o reino de Davi é o reino de Israel, cujas fronteiras, não por acaso, são as mesmas da promessa dada por Deus a Abraão.

- Este não cumprimento do pacto mesmo com a vinda do Messias e Sua morte vicária no Calvário foi atestado pelo próprio Senhor Jesus, pois a única pergunta feita por Jesus e que não foi respondida por Ele durante Seu ministério terreno diz respeito ao pacto davídico, como se verifica de Mt.22:41-46 e Mc.12:35-37.

- Esta resposta viria, por inspiração do Espírito Santo, no dia de Pentecostes, quando, na sua pregação, Pedro mostrou aos judeus que o ouviam que o Filho de Davi era Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, que seria levantado do fruto dos lombos do segundo rei de Israel, segundo a carne, para que este descendente Se assente sobre o trono de Davi (At.2:25-30). Que isto ocorrerá, diz Pedro, não se pode ter dúvida porque Jesus ressuscitou dentre os mortos e foi recebido nos céus e, por isso, Davi profetizara que o Filho de Davi era Senhor (At.2:32-36).

- Completando este raciocínio, o mesmo Pedro, na segunda pregação que é relatada no livro de Atos, feita após a cura do coxo da porta Formosa do templo, afirmou que convém que o céu contenha a Jesus Cristo até os tempos da restauração de tudo, inclusive do reino de Israel (At.3:20,21).

- Não há, pois, como deixarmos de observar que o pacto davídico apontava para Cristo Jesus e que ainda não foi completamente cumprido, visto que, apesar da edificação da casa indestrutível, ainda não se confirmou o reino de Israel e o trono de Davi a Jesus. Brevemente, porém, o Senhor Jesus, com a Sua casa já edificada, reinará sobre Israel. Além da casa construída não por mão de homens, a casa espiritual que é a Sua Igreja, também haverá de edificar um templo em Jerusalém, o templo descrito pelo profeta Ezequiel (Ez.40-46), reinando sobre um novo Israel, restaurado e que cumprirá o propósito de ser um reino sacerdotal e um povo santo (Ez.47,48). Após estes mil anos, então, o Senhor Jesus, tendo feito a completa restauração da humanidade e da criação, submeter-Se-á ao Pai e terá congregado n’Ele todas as coisas (Ef.1:10), tendo, então, a consumação dos séculos. Aleluia!

- Estas sublimes promessas foram feitas a Davi, motivo por que dissemos que é o pacto davídico, sem dúvida, o ápice da vida espiritual deste homem segundo o coração de Deus.

- Neste pacto, uma vez mais, aprendemos que os desígnios de Deus se cumprem independentemente da vontade humana, mas que a cada ser humano é dada a oportunidade de aceitar, ou não, a oferta proveniente da benignidade e misericórdia do Senhor. Assim como Davi aceitou os ditames deste pacto e se manteve fiel ao Senhor até o fim reunindo condições de desfrutar das “firmes beneficências” que lhe foram prometidas, também podemos nós nos habilitar a recebê-las, desde que aceitemos a oferta que nos faz o Senhor (Is.55:1-3).
OBS: “…É enquanto filho de Yahweh que Davi e seus descendentes desfrutariam das cláusulas deste pacto. Estes versículos [II Sm.7:14-16, observação nossa] também introduzem a possibilidade de que filhos desleais poderiam perder a oportunidade de desfrutar das cláusulas deste (cf. I Rs.2:4; 8:25; 6:12-13; 9:4, 6-7; Sl.89:29-32; 132:12). Como a Abraão (Gen 12:1-3), Yahweh prometeu a Davi uma descendência eternal e a posse da terra. Filhos leais, i.e., que vivessem de acordo com as estipulações do pacto mosaico, poderia desfrutar plenamente das cláusulas oferecidas a eles. Contudo, filhos desleais, i.e., descendentes davídicos que fossem infiéis ao pacto, perderiam a prometida proteção divina e eventualmente perderiam o gozo da autoridade e da terra. Ainda assim, Yahweh prometa que os filhos desleais perderão sua oportunidade de gozar das cláusulas deste pacto, afirma que a casa davídica e o trono durarão para sempre, dando a esperança de que Yahweh poderia levantar, um dia, um filho leal que satisfaria as exigências de Yahweh para a observância do pacto. Embora a linhagem de Davi pudesse ser castigada, os termos deste pacto, a hesed (חסד) de Deus jamais seria retirada.…” (GRISANT, Michael A. end. cit.) (tradução nossa de texto em inglês).


- Na história deste pacto, vemos homens que, apesar de seus pecados, deles se arrependeram e obtiveram o perdão divino, como é o caso do próprio Davi e mesmo de Manassés que, apesar de ter sido o mais ímpio dos descendentes de Davi, aproveitou a oportunidade para se arrepender dos males cometidos (II Cr.33:11-20), mas também temos casos como o de Uzias que, apesar de iniciado bem nos caminhos do Senhor, sendo ricamente abençoado, acabou se rebelando contra o Senhor e tendo triste fim (II Cr.26:16-23) ou de Joás que, igualmente, acabou se desviando dos caminhos do Senhor, chegando, inclusive, a cometer crimes dentro do próprio templo (II Cr.24:17-22; Mt.23:35; Lc.11:51).

- A todos estes descendentes de Davi, integrantes da casa de Davi, Deus deu a mesma oportunidade para que se mantivessem fiéis ao Senhor, a fim de receber as bênçãos da perpetuidade. Nem todos aproveitaram esta chance. Assim ocorre conosco, hoje, nós, que somos, também, integrantes da casa de Davi, visto que fomos feitos “reis e sacerdotes” por Nosso Senhor Jesus Cristo (Ap.1:6), coerdeiros de Cristo (Rm.8:17), irmãos do Senhor (Hb.2:11). Vamos desperdiçar esta manifestação da graça do Senhor? Que Deus nos ajude a perseverarmos até o fim e atingirmos as “firmes beneficências de Davi”. Amém.

Caramuru Afonso Francisco

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